Estradas...
In: Sete Contos para o Final da Tarde.
- O que me incomoda não é o que dizem, Renata! É o que omitem descaradamente... homens, mulheres que imitam o “pior” dos homens. É uma festa de mau-gosto e não quero ir...
A irmã a ouvia atenta e reflexiva. Esperou um breve instante para antes definir a fala. Depois, com muito jeito, tentou convence-la a livrar-se do cárcere o qual se meteu e não tinha intenções de sair.
- Compreendo que não goste de algumas “figuras” com as quais trabalho. São chatas, mesmo. O mundo das mercadorias é este – para vender é preciso deixar com que as pessoas acreditem nos milagres humanos da manipulação química. Sou publicitária. E iniciante! Tenho uma super chance e preciso ir... e achar “graça” quando o gerente da indústria de sabonetes “hidratantes” Eureca se desfaz das coitadas que caem na “nossa” lábia - que seja a meu contragosto! Vendemos ilusões para sobreviver. Esta é a nossa época. Da imagem e mensagem capitalista. Esta é nossa base real. Além do mais, você compra todos esses produtos. Como reclamar?
- Sei que compro! Talvez, faça parte do grupo de mulheres que sonham em algum dia, encontrar honestidade em rótulos e imagens...
- E existe, sim. Eu é que não tive sorte de trabalhar com a gente certa. Terei. Por enquanto, preciso “suportar” pelo aluguel, etc., etc., etc., que você bem sabe.
Renata sorriu e continuou carinhosa.
- A sua experiência anterior sei que não foi das melhores, devo admitir. Tome um sal de frutas, fique longe de certas “criaturas abomináveis” e aproveite as delícias do bufê. Veja o lado positivo das coisas! A comida e a bebida são sempre dez!
- Fui na sua e fiquei mais tensa! Não entende que prefiro ficar por aqui?
- Pare de pensar no que passou! Este passado é rançoso... Saia da gaiola vá, maninha! Alguém diferente, não ligado àquele “grupinho” pode estar pensando numa bela companhia como você para suportar a turminha do “falso poder”!
- A luta pelo poder pode ser mais baixa do que a pela ânsia da riqueza... essa gente é pequena, mesmo! Gravita em torno para na primeira bobeada tornar-se o centro. Aponta e alvo! Você já era!
- Ai, socorro! Eu desisto! Cansei. Ok, eu vou sozinha. Vou enfrentar os meus colegas na arena cotidiana das idéias por que isto, a inteligência e o conhecimento, ninguém pode tirar de mim. Acredite, posso ser omissa, mas não sou parasita!
Conformada, a irmã mais velha beijou a rebelde na testa, pegou a bolsa e deteve-se repentinamente:
- Ah! A propósito, dá uma limpadela no “ap”, tá? Estou sentindo um leve cheiro suspeito, pode ser algum “lixinho” esquecido por ai...
E saiu sem olhar, batendo a porta atrás de si.
A adolescente respirou fundo. Suas feições leves denunciavam a pouca idade. Seu gênio explosivo... Só confirmava!
Ficou estirada sobre a cama de olhos fixos no teto. Nele, a grande tela branca parecia ter projetada a estrada onde viajava aquela fatídica noite. A faixa contínua; os faróis vencendo o breu; o vento do lado de fora sacudindo tudo; o automóvel que surgiu do “nada”, na contramão. Faria um ano. E sequer disse “adeus” aos seus pais. Aquilo ainda lhe parecia ser impossível! Sacudiu a cabeça como se pudesse livrar das imagens medonhas que a atormentavam. Conteve as lágrimas e acabou por fixar os olhos num porta-retrato, onde cinco anos mais moça, a irmã sorria com jeito inocente e despreocupado. Pensou sufocada pelas culpas que precisava ter paciência com Renata... Repetia para si, em voz baixa, ao se lembrar do sacrifício da irmã em ajuda-la a vencer os traumas. Muito ela havia abdicado para adaptar as suas vidas... Até o marido a abandonou! Reconhecia... e relembrava: “Seis meses depois ele berrou alto e em bom tom: Tininha sai! E um triunfante som vibrou pelos quatro cantos – Tininha fica!”.
Quebrada a tensão, sorriu da cena e rolou na cama pondo-se de barriga para baixo. Entristeceu. Voltou ao presente. O resultado era que estava ali morrendo de vontade de fugir. Ficou por uns vinte minutos meditando nos contratempos: “que sacanagem com a Renata!”
Acordou de suas meditações quando um leve odor muito estranho a fez levantar para dar uma geral, pelo menos no banheiro e na cozinha.
Às 19 horas estava marcado o bufê. Renata voltou do trabalho para a casa mais cedo. Arrumou-se. Fez os seus apelos finais à Tininha que permaneceu irredutível.
- Limpou como pedi?
- Sim.
- Que cheiro esquisito... (Continuou...)
- Não descobri nenhum lixo esquecido.
- Vou indo. Depois penso nisso.
- Aproveite!
- Decerto, minha cara! Prometo que comerei a sua parte e se vir um homem bonito e interessante não me lembrarei que preferiu ficar só.
- Tchau, sua pestinha!
- Tchau, Tininha!
A garota ficou observando a porta sendo trancada pelo lado de fora. Voltou a sentir-se um tanto deprimida. Contudo, o que ainda desconhecia era que, enquanto a outra precisava enfrentar os Outros, ela teria que enfrentar Um inimigo bem mais perigoso pois, próximo e tão desconhecido...
Continua na próxima postagem...
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6 comentários:
Lindo conto, querida Fênix! Entre a realidade e a imaginação...muita verdade de sentimentos.Traumas, culpas e dissabores para uma menininha. E entre linhas uma lição de civismo para com o planeta:-) Adorei.Espero a continuação.
Bjito amigo,uma flor e bom fim de semana.
Eu passei da fase de sair e aguentar festas ou eventos onde muitas coisas possam me fazer mal ou me tirar a harmonia.
Eu fico em casa ou vou por outros cantos menos perturbadores.
Volto para ler a continuação.
Abraços
Bom dia, querida amiga.
Muito obrigada pelas suas lindas palavras carinhosas. Nossa... Quanta energia boa!!
Adorei esse romance, e estou ansiosa pelo segundo capítulo.
Tenha uma bela semana de paz e alegrias.
Beijos no coração.
Bom dia, querida amiga.
Adorei esse romance e voltarei para ler os outros capítulos.
Eu estava com muita saudade.
Muito obrigada pela sua gentileza e carinho. Isso nos aquece e nos ajuda a "tocar em frente".
Gosto demais, daquela frase lá em cima: "O CAMINHO DO ÓBVIO..."
Tenha uma linda semana, cheia de paz e alegrias.
Beijos no coração.
Tecas: é, na verdade, um rascunho. Não foi o primeiro conto que fiz inteiro, porém, é o primeiro que achei possível compartilhar, apesar das minhas falhas. A ideia principal é essa que disse: passar uma mensagem que fala a respeito do relacionamento humano, do ambiente que construímos - em todos os sentidos - e do que desconstruímos em decorrência de...
Beijos!
Mara - coitadinha da menina! Imagine a cena - gente rindo de gente como se a própria vaidade fosse menos fútil do que a das consumidoras ridicularizadas.
Bem faz você - lugares assim sugam nossas energias. Creio que eu tomaria a mesma decisão que ela...Tininha...
Bel - obrigada por tudo!
Amapola - estou feliz que tenha voltado: você é forte,mas eu precisava dizer que precisamos de você ai, desse lado da tela, colorindo-a com a essência de sua vida... o TODO não é tão bonito sem essa PARTE...
Beijos para os dois...
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