"(...) -Como eu gosto de você?

Eu gosto de você do jeito que você se gosta".

O Mundo no Engenho... e o ENGENHO do Mundo

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno III

 ( Parte 7)

Nada é por acaso: a razão em Hades 

Orfeu não se enxerga mais em Euridice. Ele teme perdê-la. Ele rejeita o que vê, mas o que vê não lhe abandona os pensamentos. E insiste em ecoar dentro dele. E tão belo quanto ele, mas não é ele. E sofre. Da primeira vez a perdeu para a morte ( morte e ressurreição dela), da segunda, para a vida - pulsão de vida ( ela me aceitará agora que despertou? ). Essa nova Eurídice que se faz igual dentro da diferença, agora, não se deixa seduzir pela linguagem/emoção. Ela assusta Orfeu porque ele ainda não conseguiu ressignificar os seus códigos de vida, compreender que passou os limites da razão, atribuindo-se dada superioridade. Em principio, ele a bloqueia e é o bloqueio que a faz "desfazer", voltando a ser um "fantasma". Ele olhou para trás porque ela não era a mesma: o seu espanto é que ele não se enxergava mais nela-o seu espelho do Eu- o lago de Narciso. ..não existe mais! Não existe mais o ser submisso e devotado, o ser sombra, ressonância, eco. Eurídice o abandonou? As ondas no lago de Narciso representam as descobertas e escolhas dela, mexe com o seu ORGULHO. Turva. Ele RECALCA. Bloqueia os sentimentos com ela porque teme ser abandonado outra vez. TRANSFERE o desejo pelo medo de se entregar à ela, para outras mulheres que lhe aceitam, a princípio, sem questionamentos reais. Isto é, seguem os passos até que surja a brecha e a invasão. A cobrança e a posse. O desejo de morte lhe impele ao fim de um ciclo em que se vê dolorosamente derrotado por si mesmo. Mas, do contrário que pensa, Eurídice não e a pedra no lago de Narciso que turva tudo. ELE MESMO O É.

Fenix Fênix Fênix Cruz


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Orfeu e Euridice (parte 8)

A mimese não nos remete à beleza da luz, apenas à dependência da sombra.

( A pena mágica)


...Esse compasso sincronizado torna alguém invisível, alguém absorvido, alguém sem face. A pergunta é quem? O original ou a cópia desaparece ? As bacantes, com suas promessas e graças, com sua força manipuladora de posse, tomadas pelo ódio DESMEDIDO e travestidas de amor e falsa submissão?
De uma polaridade à outra - amar e odiar - faz parte do jogo da vida e é o que apimenta as relações. O que dá sentido e agiganta o estar junto, na dose certa
( o meio do copo), é o odio que nos ensina a amar porque nos ensina a abrir mão do Eu Absoluto a fim de aprender a compartilhar e dividir emoções com o Eu Relativo. Na incidência do ruído - eu não vejo, MAS VEJO; eu não ouço, MAS OUÇO; eu não faço, MAS FAÇO. Pequenas gotas da Discórdia! O veneno que contamina e afasta paulatinamente.
Eu só sei a importância da luz se vi as trevas; eu só sei a importância do amor se conheci o ódio: Hades sabia disso. Orfeu, orgulhoso de si, arrogante que estava em suas decisões, desafiou Hades, menosprezou a capacidade de Euridice de lhe falar de igual para igual. Ainda assim, ela o viu, compreendeu e aceitou. O acompanhou ansiosa pela (nova) vida. Ele, resistente, ainda precisou amargar uma derrota desnecessária por não ter cumprido o determinado pela razão (Lei) de Hades. Apoiamos o Outro, somos substrato, estrutura, estímulo. Queremos a mesma visibilidade. Alimentar com afeto mútuo é obrigação de quem ama E a língua universal é a do sentimento. Contudo, não podemos viver uma vida que não nos pertence. Pisar cuidadosamente nos passos, espelhar. Podemos ter os gostos semelhantes, alguns pensamentos comuns, objetivos harmonizados. Um não é o Outro e se isso fosse possível, não seria amor. Seria obsessão. Orfeu e Euridice se encontraram na diferença, pois é na comparação com o Outro que descobrimos os vícios e os valores do próprio eu.

FENIX Fênix Cruz

Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno II



 ( parte 4)

Orfeu e o Outro: as correntes eróticas e afetivas em Freud.


"Sua visão se tornará clara somente quando você olhar para o seu próprio coração. Quem olha fora sonha; quem olha para dentro, desperta."
 
Carl Gustav Jung

Eurídice se descobre. Percebe a própria existência, além da de seu arrebatador Orfeu. O Outro abismado com a sua beleza/figurativa (o desejo erótico) mostra-lhe a capacidade de encantar/existir. E seu Orfeu? O que ele sentiria por ela?
Alguns artigos muito bem fundamentados* falam a respeito dos estudos de Freud acerca das características que determinam a escolha da pessoa amada. Apontam os conflitos que ocorrem entre a capacidade de amar e de desejar sexualmente, o mesmo objeto. Essa dificil tarefa de equilibrar as correntes eróticas e afetivas, adequadamente, requer que se vençam os fantasmas incestuosos da infância ( a interdição do incesto-o primeiro amor é o de mãe e é sagrado, portanto, todo amor teria interdição). O desejo sexual dedica-se às amantes e, o amor, à esposa, o que inviabiliza os relacionamentos. A incompletude não se faz por meio do" desgaste" ou da "rotina" externa, mas do "desgaste" e da "rotina" que são estimulados pela incapacidade interna de se vencer essa separação entre o desejo erótico e o amor afetivo. Os homens com esse conflito, destaca o estudo, quando amam não desejam e se desejam, não amam ( impotência psíquica).
Eurídice ama em Orfeu o que gostaria de Ser (sedução/talento/arma). Mas, ela se descobriu, descobriu o seu próprio Ser no mergulho para a morte: deixou o arrebatamento ou, seu estado de Ser seduzido.
E qual não foi a surpresa de Orfeu, habituado à sua linguagem manipuladora - voz e lira -, argumentos da emoção?
Razão, emoção, erotismo, amor...venha comigo. Venha mergulhar como Eurídice nas florestas densas da morte, a fim de experimentar a ressurreição...
Continua...
Fênix Cruz


*****

Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno ( parte 5)

No inferno de nós mesmos: rejeição (dilaceramento) ou aceitação (ressurreição)?

Orfeu. Esse sentimento contraditório que se faz pela perda (inconsciente) ao mesmo tempo que se dilacera com ela, traduz o medo de ceder parte de si ao Outro, como se num mergulho profundo para a morte do Eu Absoluto. Querer e não querer. Temer o comprometimento e a verdade de já não se estar mais só e sim, ligado a outro querer. Como será para esse novo Ser que antes, escolhia só a direção de seus passos? QUE CONDUZIA TUDO? Dava a palavra inicial e final?
Eurifice foge. Ela não sucumbe ao Outro, apenas se descobre e descobre um novo Orfeu: um igual na diferença. Ela ama aquilo que ele é, mesmo que revelada a face dele pois, o arrebatado se deixa arrebatar, não sendo o arrebatador culpado pelo arrebatamento: vemos o que queremos ver. Nos iludimos com o que queremos nos iludir: eu nunca serei o Outro, devo então, seguir os meus caminhos.

E seguir, sem olhar para trás?

Quem você é: Orfeu ou Eurídice?

...não desista.

Não desista de mim, nem de si, nem de nós. Cuidado com os ruidos!

Fenix Fênix Cruz
Continua...

*****


Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno ( parte 6)

Para quem nos quer arrancar os braços, não devemos oferecer as mãos: as mênades/bacantes.

A melancolia de Orfeu se traduz em seu fracasso. Na culpa pela perda de Euridice a lhe consumir dia-após- dia: a contínua queda.
Orfeu, em sua fragilidade e dor, já sem a convicção exagerada em si e sem Euridice, caminha para o oposto radical e se torna um ser atormentado. De guarda baixa, atrai para si toda sorte de problemas, atrai o desejo das Mênades ou, das bacantes. Desse mundo passageiro - o da mera satisfação no ato sexual -, tudo busca e a nada se apega. Apenas se desloca de um objeto de desejo para outro e nada preenche e satisfaz. Ele é um corpo sem alma. Um corpo vazio. O amor cultuado à morta (o rosto que não é o seu) e a apatia de Orfeu provocam o ruído: "se não posso ter destruo". E assim, as mênades vão lhe despedaçando parte por parte aproveitando-se de sua debilidade, de sua incapacidade de vencer o ruído provocado por elas, escoladas e experientes que são.
Uma a uma...Elas pediram e Orfeu ofereceu as mãos. Religiosamente cumpriu os seus rituais e cada vez mais sentiu-se sem solo. Sugado em suas energias. Aparentemente submissas, não aceitam a rejeição, embora estejam cientes de que nada lhe representam.
O ruído se contrapôs à canção.
As mênades surgem nos momentos em que a ferida escancarada sangra e o lago de Narciso torna-se o espelho que o chama e engole -pulsão de morte. É quando Orfeu se debate. Agoniza. Não compreende...
Intimamente, é um mergulho para ela...

Por quê?
Fenix Fênix Fênix Cruz

domingo, 20 de maio de 2018

Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno

 Parte 1 (Originalmente publicado no Facebook, em março/abril/maio de 2018)

Carl Gustav Jung*

Shakespeare e tantos outros autores e poetas já foram seduzidos pela força reflexiva e atemporal que nos remete a mitologia grega. Grandes obras nasceram inspiradas nelas e, a psicologia e a psicanálise, além de outras, fartam-se da sua vasta fonte linguística / interpretativa. Orfeu, o belo jovem e sua inebriante Lira que encantou entre outros, o barqueiro Caronte, o cão Cérbero e até Hades, de volta de sua epopeia com os heróis - em busca do Velocino de Ouro -, encontrou, finalmente, a sua amada, Euridice. Casou-se. Contudo, ela vítima de uma perseguição acabou morta em sua fuga, picada por uma serpente.
Orfeu inconformado, tomado pela melancolia, ganhou a comoção de um a um e também dos deuses, só bastava tocar e cantar a sua tristeza. Hades e Persefone, lhe permitiram levar Euridice do inferno com uma condição: a de que não sucumbisse ao desejo de olhar para trás enquanto não saíssem à luz do Sol...

Entretanto, por que teria Orfeu olhado para trás?
CONTINUA...
(Acharam que seria fácil assim? )
Kkkkk...
Fenix Fênix Cruz


Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno ( parte 2)


"A minha verdade é te fazer compreender a própria verdade."
Fenix (A pena mágica)


A voz e a lira do encantamento. ..


Diz o mito que Orfeu era dotado de beleza e de talento. Que ajudou a vencer batalhas seduzindo com a sua música os brutos e os inimigos. Na verdade, seu encanto e influência nada mais eram do que as suas grandes armas de atuação sobre as pessoas e sobre o mundo. Assim, conquista afetos com a sua melodia e os manipula a fim de atingir o fim desejado, desde o inicio de sua jornada até chegar à Eurídice, no plano inferior. Domina o inconsciente dos Outros ganhando confiança em Si, demasiada. Isto é, acredita que pode tudo e que sempre terá nas mãos o que desejar, a partir da sedução/talento/arma. Neste contexto, outras perguntas emergem para dificultar a análise e ficará a cargo de cada um respondê-las:
1 - em relação ao olhar para trás, Orfeu tinha confiança exagerada em si e a vontade de testar o seu domínio sobre os deuses, sendo ele um semideus ?
2 - Ou medo de Eurídice e a necessidade inconsciente de auto preservação, o faz perdê-la?
E eu te convido a descer comigo para o Inferno...Você topa? Dê-me as mãos...
Continua...

 
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Orfeu e Eurídice e a crônica do amor e do inferno ( parte 3 )


Sedução/talento/arma - Eurídice e o arrebatamento como o olhar do arrebatado.

"Até que você torne o inconsciente em consciente, aquele irá direcionar a sua vida e você irá chamá-lo de destino".

Carl Gustav Jung

Eurídice foge de seu perseguidor apavorada. Atravessa a floresta e a serpente a mata. A floresta é o "Eu" desconhecido, o seu subconsciente, o seu submundo interior. A serpente, o conhecimento súbito de sua própria existência: de sua face. É por meio do Outro que se opõe a seu Orfeu, que Eurídice torna-se visível para si. Esse Outro, diferente de Orfeu, esse Outro que sem face
( sedução/talento/arma) a enxerga por si, como é, por seu próprios talentos. Assim, a serpente a mata para o passado dominado pela influência - em sua totalidade - de seu sedutor Orfeu. O arrebatamento, isto é, a sedução/talento/arma se revela na contraposição das três faces. Ela se descobre, descobre o Outro e morre para a sua antiga existência. É o abalo mais severo nas relações: a beira da morte, ela faz uma viagem dolorosa numa reflexão acerca do propósito de sua vida e dos caminhos percorridos, até então, por ela: sombra ou luz? Os dois? O que foi e o que é até então? um "Ser" ou um "Não Ser" voltado para o "Ser"?
Respire fundo e muito lentamente, agora. Sinta a descida. .. será a queda?
Diga-me: o que você é até agora?
Fenix Fênix Cruz
Continua...

 Notas ao fim dos textos
 
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